26 janeiro, 2009

A Busca - 3ª parte

Enquanto ouvia o pretenso guia de sua jornada, Moisés perdeu-se em seus pensamentos, lembrando do que todos passaram para chegar até aquele momento e de como um grupo tão seleto, composto de seres com personalidades tão diferenciadas, pode caminhar unido e coeso, até sua dissolução natural, não por cansaço, mas por conseqüência de seus atos. Suas pretensões nunca ultrapassaram os limites de seu pequeno templo, em sua terra natal. Participar de incursões fantásticas, como acontecera, era algo tão distante quanto o afastamento do sacerdócio e alcançar o patamar ao qual está também. Ele imaginava um futuro mundano, até perceber a oportunidade de levar a palavra de Selimon mundo afora. Apesar das diferentes crenças presentes entre seus amigos, o respeito mútuo sempre fez parte da união. Esse respeito ensinou-lhe que, independente da religião, os seres continuam sendo seres e Selimon protege a todos. Talvez essa tenha sido sua maior escola, transformando-o no sacerdote-mor de sua ordem e fazendo com que Selimon o presenteasse com suas maiores dádivas, o dom da cura e seu símbolo sagrado, Veriante. Não uma arma, mas um objeto que seria usado tanto para defender seu templo, quanto para construir moradias ou libertar inocentes.
Pensou em sua idade e em si mesmo, refletindo. Moisés, no início da jornada do grupo, era o mais experiente, já tendo 28 anos de idade e 15 de celibato. Agora, com 62 anos, ainda mantinha-se em forma e aparentava ser mais jovem, apesar da longa barba branca. Os cabelos, ainda curtos, como de costume, permaneciam completamente castanhos. Seus olhos, quase negros, carregavam o peso dos anos, não pelas rugas, mas pelo olhar. Seu semblante era sempre sereno, transmitindo tranqüilidade a quem tivesse contato com ele. Dizia-se que Selimon protegia os seus com vida longeva e Moisés parecia ser a prova de tal afirmação.
Sua armadura metálica, adornada por símbolos sagrados de sua religião, o deixava mais imponente frente a outros humanos. O elmo em especial possuía o principal símbolo de Selimon em sua fronte, a forquilha. Três extremos unidos no centro. Os três cantos do mundo unidos num só pensamento de bondade. Um manto sacerdotal branco cobria-lhe praticamente todo o corpo tendo a forquilha bordada cuidadosamente em toda sua extensão. A religião selimônica era universal e por onde passava, adeptos o reconheciam e reverenciavam. Veriante o acompanhava onde quer que fosse e, como dito anteriormente, nos últimos anos era usada apenas como objeto sagrado, mas naquela jornada deveria ser usada em sua defesa.
Em diversas ocasiões, Moisés acreditou ter passado dos limites, com relação à violência. Seus preceitos religiosos e íntimos o levavam a evitar confrontos de qualquer espécie, porém Moisés sempre fora honrado e valoroso como amigo e em defesa dos fracos. A religião selimônica prega a paz e o amor entre os seres, mas também prega que aqueles que não os querem não podem praticar o mal. Caso o façam, a ordem tem entre seus sacerdotes, mestres nas artes da guerra, ainda que essa palavra seja abnegada pelos seus sacerdotes. Sendo Moisés líder dessa ordem de Guerreiros da Luz, como se auto proclamam, em diversas ocasiões ele defendeu os mais necessitados, seus amigos e sua terra.
Algumas características inerentes de seres pensantes ainda o acompanhavam. Não pensava muito no progresso. Tecnologia, uma palavra recém inventada, o deixava desconcertado, principalmente porque os avanços, na maioria das vezes, se davam no decorrer de algum conflito, sendo essa a desculpa, na sua opinião, para o desenvolvimento da civilização. Procurava manter-se sempre afastado. Um exemplo era o uso do fogo. Por diversas vezes presenciara seu amigo Simon criar labaredas do nada, que saíam de suas mãos e acendiam fogueiras ou afastavam inimigos, mas, misturar pós encontrados na natureza e fazer fogo? A natureza era a coisa mais espetacular criada por Selimon. Usá-la para tal fim era amedrontador...
Sua rusga a respeito do mal uso de magia não sacerdotal também se mantinha. Ele acreditava que tal dádiva deveria ser usada com responsabilidade e parcimônia. A total ira contra mortos vivos e outras criaturas relacionadas ao reino dos não viventes era sua maior fraqueza. Ódio era um sentimento que ele suprimia, porém esse aspecto de sua personalidade o acompanhou desde a mais tenra infância. Talvez pelo fato de sua terra natal ter sido vítima de uma praga zumbi, aproximando-o de sua atual religião, ou pela constatação posterior que o que estava morto deveria ficar morto, pois, caso houvesse reanimação, este ser se tornaria mal e, como tal, avesso a seu deus. Ele não sabia ao certo, apenas odiava tais seres e todas as coisas relacionadas a eles. Apenas um foi tolerado e outrora esta pessoa foi conhecida pelo nome de Yirn Blackstone. Um antigo amigo. Fiel, generoso e honrado aos olhos de Moisés. Uma criatura inocente, levada aos campos da violência por preconceitos referentes a sua raça. O único que escutava seus sermões com atenção, mesmo parecendo entender pouco o que Moisés dizia. Ele sempre se recorda do acontecido... Numa incursão na dimensão chamada Plano Mental, Yirn fora tragado por garras malignas provenientes de um fosso negro. Ao voltarem ao plano terreno, seu corpo havia sumido e o grupo não mediu esforços até encontrar o amigo nas mãos de um necromante chamado Vrillian Groz. Este fazia um feitiço que suprimia a mente e a alma de Blackstone, inserindo uma alma demoníaca em seu lugar. Ele e seus companheiros conseguiram conter o mago, mas não a ponto de salvar seu amigo. Seqüelas da tentativa de possessão o acompanharam, transformando-o numa espécie de ghoul, um morto vivo consciente. Esse fato os afastou... Ao ponto do amigo abandonar o grupo. Nesse ínterim, Moisés refletiu muito sobre o assunto, orando para que Selimon o ajudasse a ser mais compreensivo. Tempos depois, Yirn Blackstone se reencontrou com o grupo, portando-se de forma mais adequada a seu estigma e fora bem recebido. Mais um aprendizado para Moisés. Sentia saudades de seu amigo. Reencontrá-lo e tentar salvá-lo era sua prioridade.

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