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12 outubro, 2008

Reator do Proletariado - Gênese parte 3


O general Ihor Krushiev possuía um vasto currículo no glorioso Exército Vermelho. Fora muito respeitado e, apesar de idoso, ainda participava ativamente de incursões militares em países vizinhos. Assim aconteceu durante a Guerra do Vietnã, onde ficou até 1979, quando retirou-se para o que ficou mundialmente conhecido como Guerra do Afeganistão. A invasão desse país, liderada por ele, acontecera da maneira como foi planejada, porém manter o domínio tornara-se algo extremamente complicado. Em 1982, as forças armadas soviéticas controlavam apenas 20% do país, com um governante fraco, sem apoio popular e com Ihor como comandante militar. Em 1984 o contingente soviético era de 250.000 homens e o Kremlin começou a se incomodar com essa situação insustentável. Krushiev possuía amigos poderosos, mas esses, como outros menos “amigos”, tentavam convencê-lo a se tornar um burocrata e esconder-se atrás de uma mesa. No alto dos seus 65 anos, ele acreditava ser completamente capaz de comandar tropas de campo, mas não era isso que o alto comando achava e suas últimas ordens de comando demonstravam certo grau de incapacidade. A ocupação do Afeganistão não teria fim imediato e, desde a entrada do atual Premiê, a troca de comando seria inevitável. Fora oferecido um cargo no Ministério da Guerra em Moscou e, como segunda opção, a diretoria de uma prisão federal na Sibéria. Ihor foi tomado por uma fúria que nunca havia sido externada, pois o mesmo era conhecido por sua fleuma inabalável. Moscou não era opção e, de forma extremamente passional, o general solicitou tua transferência para a Sibéria. Ele sabia que seria sua derrocada canção.
Presos políticos nunca foram importantes na sua concepção de política interna. Para ele, a União Soviética era muito maior que isso e essa era a única vertente da política stalinista com a qual não concordava. Como muitas outras crianças, ele conhecera “Papai Stálin” e recebera doces do mesmo. Stálin era a imagem da liderança para muitos soviéticos e, para os que não o viam dessa forma, primeiro viria a prisão, depois a morte. Krushiev acreditava no poder da persuasão limpa e gradual. Levar o opositor a acreditar em seus princípios, como se fossem dele. No Vietnã ele provara que conseguia fazer tal coisa, pelo menos com camponeses e soldados do Vietnã do Sul, insatisfeitos com seus superiores. Ao invés de tortura, usava o poder da psicologia, dissuadindo inimigos a ficarem do seu lado. Esse traço importante de seu comportamento numa foi aproveitado pelo Kremlin e depois da semi-fracassada campanha no Afeganistão, a mudança para o gulag siberiano seria sua sentença de morte.
E assim foi, por vários longos meses. Ihor optou por não perturbar a rotina vigente e a prisão continuou trabalhando como a locomotiva que era anteriormente. O general mantinha contato constante com Novosibirsk, tentando manter-se atualizado. Em 28 de abril de 1986, seu contato em Novosibirsk informou que os sismógrafos da capital siberiana registraram um tremor de terra de mais de 5 graus na escala Richter a menos de 300 km de seu gulag. Seria ótimo se ele pudesse investigar tal acontecimento, afinal, terremotos dessa magnitude na Sibéria era algo raro e, tentando livrar-se do marasmo, o General Ihor Krushiev comunicou a Moscou e partiu na direção indicada.

27 março, 2008

Reator do Proletariado - Gênese parte 2

Quando criança, um sonho perseguiu Mikhail por algum tempo. Nathalia era a menina mais bonita da escola, pelo menos a seus olhos e, nesses sonhos, ele tentava conversar com ela, sempre sendo ofuscado por algo que não sabia o que era. Uma luz extremamente brilhante fazia com que desviasse o olhar, sempre que tentava fitar algo a sua frente. E acontecia quando ela chegava... Mikhail não entedia o por que. Depois de algum tempo, começou a acreditar que o motivo seria a imagem que ele fazia da menina. Sendo isso ou não, a verdade não demorou a aparecer. A janela entreaberta de seu quarto deixava os raios de sol baterem exatamente nos seus olhos, criando essa sensação estranha em seus sonhos.

O despertar foi como o sonho. A sensação de "deja vu" inevitavelmente aconteceu, apesar da nebulosidade mental do momento. Não conseguiu abrir completamente os olhos e usou as mãos para se proteger. Reclamou como uma criança que acaba de acordar pela manhã e esperou até que seus olhos se acostumassem à luminosidade. Quando pôde abrir os olhos, visualizou o céu aberto de um dia ensolarado. Pensou no que estaria fazendo dormindo em campo aberto, mas essa era a menor de suas preocupações. A principal ainda não lhe ocorrera.

Olhou para os lados, procurando algo conhecido. E só viu o céu. A situação estava cada vez mais estranha, beirando a bizarrice. Por que se deitaria em um lugar tão alto? Apoiou as mãos para poder levantar-se... Apoiou? Onde? Quando olhou para baixo o pavor tomou conta dele ao perceber que o leito confortável onde descansava era o próprio céu. Como que num desenho animado de um certo pássaro veloz e seu algoz coiote pôs-se a cair! Lembrou-se remotamente de ter sentido algo semelhante anteriormente, algo a ver com trampolim e piscinas, mas nunca assim. Não conseguia gritar, apesar de sentir suas cordas vocais em um movimento frenético em sua garganta...

Após dois minutos de queda, nada mudou. A aceleração da gravidade não ajudava muito e o misto de terror, frio e velocidade exagerada o fizeram desmaiar.

Naquele dia, sismógrafos de Novosibirsk, capital da Sibéria, registraram um tremor de terra de 5.4 graus na escala Richter, 150 km ao norte.

13 março, 2008

Reator do Proletariado - Gênese

Imagine um motor à explosão. Daqueles que se usam nos carros. Poucos sabem como funcionam, sendo que não é algo muito complexo. É chamado erroneamente de “à explosão”, pois todos acham que o movimento se dá pelas explosões internas, quando na verdade, acontecem por aumento e diminuição de pressão, sendo seu nome real motor de combustão interna, mas como o termo “explosão” agrada mais aos olhos, fiquemos com ele. Internamente, para que hajam as explosões, necessita-se de combustível e oxigênio. É de conhecimento geral que quando a energia gerada pela reação química da explosão é convertida em energia mecânica, que faz o veículo se movimentar, uma parte dela se converte em calor, ou energia térmica, aumentando a temperatura do artefato em questão podendo causar dano permanente. Para que isso não aconteça, vários artifícios refrigeradores podem ser usados, no caso dos veículos automotores: água e radiador. Calor sempre foi o grande vilão, tanto em máquinas a vapor quanto em eletrônica. Tudo necessita de refrigeração permanente e eficiente. Numa usina nuclear não haveria porque ser diferente.

Com energia nuclear a reação é menos macroscópica. Alguns isótopos de certos elementos apresentam a capacidade de, através de reações nucleares, emitirem energia durante o processo. É o caso do urânio, elemento mais usado nas usinas nucleares. Essa energia, devidamente trabalhada, é convertida em eletricidade. Refrigeração constante e controle permanente são essenciais para o bom funcionamento de uma usina. Dois erros...

Refrigerar algo que já está em colapso é redundante e perigoso, como tentar apagar um vulcão com milhões de litros de água. Mikhail era esforçado, mas seu conhecimento se limitava aos manuais. A alavanca que dispersava o aparato refrigerante no reator parecia a única chance de salvação. As paredes de concreto e aço da instalação pareciam tremer, não se sabe se pela pretensa explosão ou pelo pavor que tomava conta do operário. Aquele momento se tornou infinito.

Ser reconhecido como herói na União Soviética, ser condecorado pelo premier Gorbachev, voltar a Moscou, ser promovido a algum cargo no Kremlim, poder dar boa vida novamente a sua mãe... Esses pensamentos permeavam sua mente, fazendo seu coração se acelerar como nunca antes. Chernobyl era importante para o povo ucraniano e para toda a união e perdê-la seria o fim de uma era de desenvolvimento. Seu treinamento não simulou superaquecimento e não era sua responsabilidade, porem, ele era o único.

Tanto movimento cerebral em 2,54 segundos.

O topo superior do invólucro do reator literalmente alçou vôo, caindo a alguns quilômetros de distância. O governo soviético camuflou grande parte das informações pertinentes ao acidente, deixando milhares de pessoas a mercê da radioatividade, reescrevendo suas histórias de vida. Com Mikhail não seria diferente.

24 junho, 2007

Reator do Proletariado

Parecia um início de turno como qualquer outro, onde técnicos entram e saem de seus postos, sem muito o que falar. O cansaço toma conta dos que deixam o trabalho e o tédio dos que chegam. O trabalho em Chernobyl não era dos melhores, mas trazia sustento para Mikhail Chevchenko e sua família. O frio era insuportável, fazendo com que o trabalho se tornasse mais agradável naquele meio de feriado prolongado.

A transferência de Kiev para Pripyat tinha acontecido sob reclamações da mãe de Mikhail, mas, como um jovem de 25 anos, recém formado Técnico Nuclear pela Escola Técnica de Kiev poderia trabalhar em Kiev? Teu pai morrera quando ainda era criança. Possuíam uma vida tranqüila antes de sua morte, pois sendo militar e fazendo parte do Partido nunca foram incomodados pelo governo. Após a morte do pai, ainda sem explicação, como a maioria das outras, a vida mudou. As dificuldades começaram, os amigos sumiram, o Partido já não se fazia presente. Com muita dificuldade e esforço de tua mãe, Mikhail conseguiu terminar os estudos e conseguir um emprego estável. Não agradava a ela seu único filho trabalhando na que seria a maior e mais segura usina nuclear do mundo, mas as opções eram escassas e a mudança foi feita.

Com apenas 3 meses no trabalho Mikhail ainda não se sentia tão entediado quanto seus companheiros de profissão. Chegava bem disposto e cumpria com maestria seu trabalho, sempre curioso por conhecer os procedimentos da usina. Ele fora informado que testes seriam efetuados para verificar os protocolos de segurança e que deveria ficar de prontidão.

Junto com ele trabalhavam mais 2 técnicos, Yuri Andreivitch e o outro que era conhecido apenas por Boris, sujeito que pouco falava e por isso não conhecia muito. Mikhail e Yuri passavam boa parte do tempo conversando pois o reator 4, do qual eram responsáveis pelo controle dos sistemas de emergência e refrigeração do núcleo, sempre fora estável. Yuri estava um pouco inquieto, devido ao teste que seria realizado:

- Não são testes de rotina, Yuri?

- Na verdade não, Mikhail. Em todo o tempo que estou aqui, nunca realizamos algo assim. O desligamento dos nossos sistemas deixam o reator sem controle algum de refrigeração. Os engenheiros disseram que será um teste rápido, mas mesmo assim me preocupo. O que acha, Boris?

- Acho que estamos aqui pra obedecer... – e sai da câmara.

- Ele sempre foi simpático assim?

- Só quando o vejo, hehe. Vamos esperar as ordens.

Enquanto isso, toda a sala de controle se preparava para efetuar os testes. As informações eram passadas de dez em dez minutos pelo sistema de comunicação deixando os técnicos em alerta. Próximo da uma da madrugada, os técnicos da segurança foram informados que deveriam desligar seus respectivos sistemas o que foi prontamente feito. Vinte minutos após o início do teste os problemas começaram. A situação deveria ter sido controlada em questão de segundos, mas os sistemas de segurança do reator 4 não entraram em operação:

- Era algo assim que eu temia!

- O que devemos fazer? O automático não funcionou, precisamos ativar manualmente! Onde está Boris? Essa é sua função!!!

O alerta já havia sido acionado e os protocolos estavam sendo seguidos por todos os técnicos. Yuri tentava desviar sistemas de refrigeração oriundos do reator 3, mas o superaquecimento cada vez mais piorava:

- Tenho que acionar no manual. Vou até a câmara de compressão do reator ativar o sistema.

- Mas você não tem o treinamento necessário, Mikhail! Onde está aquele maldito Boris???

- Sempre me mantenho informado dos protocolos de segurança de toda a usina. Posso fazer isso. Avise aos engenheiros e trate de sair daqui, vou vestir a roupa anti-radiação e ligar o sistema.

“Aquelas noites perdidas, lendo os manuais têm que servir pra alguma coisa” era a única coisa que passava pela cabeça de Mikhail. Para um simples soviético do interior aquela usina significava o ápice da tecnologia e, apesar das informações que chegavam do ocidente, a propaganda do partido ainda era a mais forte. Isso trazia uma certa segurança pois tecnologia e segurança andam sempre juntas, pelo menos assim pensavam todos.

Mikhail não tardou a chegar à câmara de descontaminação e rapidamente vestiu-se de todo o aparato necessário para se aproximar com segurança do reator. Dois minutos e estava pronto, certificou-se de trancar a câmara de descontaminação e foi em direção da câmara de compressão. “Rápido, rápido!!!” era o que passava pela sua cabeça, ultrapassou a ultima escoltilha, trancando-a, se aproximou dos controles de refrigeração. Os controles estavam completamente loucos e as leituras mostravam níveis absurdos de calor.

Ali estavam os controles e Mikhail sabia o que fazer, a primeira alavanca foi acionada e...